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Foto do escritorElle Oliver

Woke Washing x Shein

Faz tempo que eu queria cagar uma regra sobre a Shein (se pronuncia como o inglês Shine), varejista chinesa de ultra-fast fashion online.

Tirando a parte que eu estou sendo paga pra alguma coisa...


Preço baixo e estilo para todos os tipos de pessoas é sem dúvida, o que seu público mais elogia na marca.


Essa semana, a Shein abriu uma pop-up store (loja de curta duração) que funcionará por 10 dias no shopping VillageMall (vulgo minha casa) localizado no RJ.

0 nicho ecológico de uma Elle Oliverus em seu habitat.


Além disso, a marca planeja trazer parte da produção para o Brasil e, seu fundador, já assinou alguns contratos confidenciais.

Outro motivo para a marca prosperar, é não possuindo lojas permanentes. Assim, ela consegue economizar realizando suas operações exclusivamente online.

E por falar em online, com seu preço reduzido, muitos clientes conseguem comprar grandes quantidades de itens sem pagar imposto na alfândega.

Isso já criou uma grande discussão em quem ama partir uma fatia de bolo e comer o que sobrou.

Recentemente, um grupo de empresários incluindo Luciano Hang (dono da Havan) entregou à cúpula do governo um documento com supostas denúncias contra empresas fora do país, que vendem produtos diretamente a pessoas físicas no Brasil. Entre elas estão Aliexpress, Shopee, Wish (tenho medo dos produtos que essa loja vive me indicando em seus anúncios), Shein e Mercado Livre. O documento chamado ''contrabando digital'' alega Cross Border: prática que consiste na compra online de produtos de outros países como EUA e China.

No documento, empresários dizem que sofrem há anos com a concorrência desleal dos produtos importados (não sei vocês, mas tudo o que eu compro nesses sites sequer existe em lojas como Havan).


A ideia do grupo é que o Governo Federal promova mudanças tributárias, de preferencia, diretamente nos itens ao invés de pagar essa taxa na hora de retirar o mesmo.

Depois de caçar minha presa, observo a galerinha rica esfregando as mãos como moscas pensando ''um dia sem estragar a vida dos mais pobres e ganhar em cima disso, é um dia perdido!''


Voltando para a pop-up Store, no segundo dia de funcionamento, já tinha uma enorme fila - na maioria de adolescentes - ao lado da loja. Seu público já dava vida ao shopping que em um dia comum é bem tranquilo, tão tranquilo, que seu ar condicionado faz nevar no calor de 40 graus do Rio de Janeiro. Tão tranquilo, que existem mais carpas no seu lago central que clientes.


Esse é o Clóvis, a maior carpa do lago. Acene para ele e ganhe um blob.


Seu nível relativamente tranquilo de consumidores se dá na maior parte, por ser um local focado em clientes de marcas de luxo.

A loja estaria lotada de pessoas em seu primeiro dia de funcionamento porém, este foi um evento fechado somente para convidados (influencers e tal).


Essa estratégia segue o principal motivo de sua fama: foi uma das primeiras marcas a utilizar o poder do aplicativo Tiktok e de seus influencers. Lá, é bem comum encontrar hashtags mencionando a marca ou ''Haul'' - vídeos em que influencers mostram uma coleção de itens comprados de alguma marca - os mais comuns começam com ''avaliando comprinhas da Shein'' onde mostram várias sacolas da marca, experimentam e dão seu veredito. Na maioria dos casos, alguns itens sempre possuem algum problema: a roupa é transparente demais por não ter forro, a costura está mal feita, o tecido não é de qualidade... Mas e daí? Foi ''baratinho!''

Interior da Pop Up Store

Além de ter focado em influencers e artistas, a Shein conversa muito bem com os jovens aplicando a psicologia da nova geração; uma agenda que inclui: itens para todos os tipos de corpos /belezas e preocupação com problemas de cunhos ambientais e trabalhistas.


É aí que entra o Woke-washing.

Sim, mais um termo em inglês para alguma coisa.

Ele é a junção de todos os outros termos, um megazord do terror: green washing, pink money, social washing... Em resumo, woke-washing é quando a empresa coloca no seu hall de ideais tudo de mais lindo, ela é #blacklivesmatter, ela faz posts defendendo o público LGBTQIA+, é cruelty free! Não polui o meio ambiente e até doa dinheiro para focas japonesas órfãs. Recicla e se preocupa com todos os diferentes tamanhos e tipos de corpos. Lindo né?

Pena que as marcas utilizam de todas essas agendas como marketing e não implementam internamente essas políticas. Na verdade, elas são até extremamente danosas para essas agendas. Quando isso acontece, chamamos e woke-washing.

Mas o que a Shein tem a ver?

Eu poderia dar bons exemplos de woke-washing com marcas daqui mesmo mas, escolhi a Shein especificamente por ser um caso que consegue envolver muitos exemplos, infelizmente.

Primeiro, vamos ver como ela funciona:

A marca faz uso de vários métodos para identificar as atuais e futuras tendências (segundo o governo Indiano, ela faz isso através de roubo de dados, mas isso aí já dá outro texto). Após essa identificação, a Shein produz seus itens novos em pequenas encomendas, de até 100 unidades - muito menor que a marca de ultra fast-fashion Boohoo, que produz de 300 a 500 unidades - Se essa pequena quantidade for bem em vendas e/ou virar viral nos aplicativos, a loja rapidamente aumenta exponencialmente seu pedido. Isso tudo dura no máximo três dias. Um dos motivos da Shein se colocar como ecologicamente correta é inclusive, o número baixo de peças que ela coloca para teste, alegando assim, pouco prejuízo e lixo.

RISOS.


Sua maneira de operar é bastante simples e parecida com aplicativos de serviços. Primeiro, identifica a tendência e aí, envia seu pedido à pequenas e médias fábricas da China. Como um Uber, a primeira que aceitar, será responsável pela produção do item. Assim que ficam prontos, são entregues à Shein.

A empresa não compartilha nenhum dado sobre suas fábricas parceiras ou seus trabalhadores. Porém, ela afirma que nunca utilizou de mão de obra escrava e/ou infantil - sempre fazendo propagandas contra qualquer prática antiética -.

Apesar dessas falas, a marca recebeu 1 em um total de 100 pontos no último Fashion Transparency Index, índice que classifica a transparência de grandes marcas. Para melhor comparação, a Zara (sim, a própria sinhazinha da fazenda) recebeu 36 pontos.

Assim, fica impossível checar se há pessoas em trabalhos análogos à escravidão por exemplo.

Hipoteticamente, se isso vier á tona, a empresa pode apenas vir à público e dizer que ela própria não tem responsabilidade sobre o ocorrido já que terceriza o trabalho.

Ela mesma já utilizou dessa tática para outra coisa...

A empresa chinesa foi citada em uma investigação no Canadá supervisionada por Miriam Diamond da Universidade de Toronto por vender jaquetas infantis com quase 20x a quantidade de chumbo permitida pelos regulamentos de segurança da Health Canada. A empresa também vendeu uma bolsa que excedeu 5x os níveis de chumbo permitidos.

A Shein notificou que pararia de vender os dois itens e deixaria de obter suprimentos com os fornecedores correspondentes...

... Até que o problema fosse resolvido.

With a taste of your lips, I'm on a ride; You're toxic, I'm slippin'under


E por falar em produtos tóxicos, com o aumento do consumo e a promessa de preços baixos, uma das economias precisa ser no material. Tecidos de Acrílico, poliéster, polietileno, pvc, são tipos de fios de polímero ou seja, plástico. Esses tecidos, na maioria das vezes, possuem uma vida útil curta.

Eu queria TANTO essa peça, toda Verdades Secretinhas - mas me recusei a comprar em prol de tudo o que acredito. Amém.


Com isso, acabamos jogando-os fora quando não possuem nem mais a opção de doação. Essas roupas começam a se desfazer mais e mais com o tempo porém, sem sumirem por completo. Se transformam em pequenas partículas de plástico que acabam sendo ingeridas por animais e poluindo o ambiente.

Agora imagine todo esse processo de poluição:

  1. Produzir tecido à partir de materiais fósseis.

  2. Comprar roupas com esses tecidos em grande quantidade -já que é barato- e aumentar sua produção.

  3. Continuar comprando mais e mais vezes já que são peças pouco duráveis.

  4. As peças que descartamos vão parar em lixões em todo o planeta

  5. Depois de muito tempo, se fragmentam e conseguem se espalhar ainda mais. Acabam poluindo a natureza e matando a fauna que sem querer, consome o plástico.


Isso tudo sempre aconteceu em cadeias de fast-fashion mas conseguimos dobrar a meta com o ultra fast-fashion aplicado por marcas como a Shein.

Não ter dinheiro para comprar roupa - comprar roupa com tecidos baratos- a roupa estragar rápido - Não ter dinheiro para comprar roupa - comprar roupa com tecidos baratos - a roupa estragar rápido - É um mantra!


Acabei de ter um vislumbre... Sabe o que é tão irônico nisso tudo? Eu sou designer e não tenho dinheiro para comprar roupas de lojas melhores porque as pessoas têm certeza do quanto o meu trabalho vale e não ao contrário. Afinal, qualquer um pode fazer né?

Nos últimos anos, uma das estratégias das ultra/fast-fashions é contratar influencers para fazer coleções.

Seria legal ter uma roupa de quem você admira se, ela possuísse a mesma qualidade de conteúdo que essa pessoa te oferece. Esse contrato é maravilhoso para as duas partes, uma vez que o influencer não precisa ser designer ou ter qualquer tipo de conhecimento e, ainda terá pouco ou nenhum trabalho em desenvolver a coleção; buscar e pesquisar materiais, referências, construir um conceito para a coleção, desenhar, testar a modelagem... Cara, cansei de escrever. Enfim, vai poupar um tempão e trabalhão dele e ainda, enriquecer a marca. A empresa arrecadará do público trazido pelo influencer, bem como se aproveitará de sua imagem.


Produzir algo tão rápido, sem pesquisa o suficiente e materiais ideais para uma coleção acarreta em muitos problemas como aquelas imagens de bolos:

A ideia original vs ela finalizada

Outras vezes, acarreta em coisas piores como casos de roubos e cópias por pequenos a grandes varejistas e pessoas da indústria no geral.

Em 2018, a Shein foi processada pela Levis por copiar uma costura que possui marca registrada. O caso foi resolvido fora dos tribunais.


Em 2021, a AirWair - conhecida pelas botas Dr. Martens - acusou a Shein de vender cópias de seus desenhos (e chamá-los de... Martins...kkkk) a um preço bem mais barato enquanto usavam fotos de autênticos Dr. Martens para ''atrair clientes''.

No mesmo ano, a Ralph Lauren entrou com uma acusação contra a loja de ultra fast-fashion, pois a empresa estava vendendo roupas de uma marca ''confusamente semelhante'' e isso era uma exploração de sua ''boa vontade'' e reputação.

Particularmente, se isso desse em alguma coisa, todas as marcas seriam processadas. As marcas de luxo seriam processadas por pequenos designers, as fast fashions seriam processadas por marcas de luxo e o camelô processaria as fast fashions. Uma grande orgia de cópias.


Ela também foi acusada por diversos pequenos artistas por roubo, eu realmente gostaria de citar todos aqui mas a quantidade é astronomicamente imensa, sugiro dar um Google ou ler minhas fontes.

Fui de berço nesse ar condicionado abençoado


Pra encerrar eu faço algumas perguntas:


1.Se as pessoas que mais compram na marca dizem não ter dinheiro (carece de fontes rs) para quebrar a cadeia comprando em lojas com preços um pouco maiores (em qualidade também) ou brechós, porquê sua primeira pop-up store foi em um shopping de luxo?


2. Porquê de todos os lugares do mundo, o Brasil está sendo escolhido para ser o próximo ponto para produzir os produtos da marca?


3. Porquê sempre caímos na armadilha que o marketing cria, fazendo com que tenhamos necessidade de coisas que não precisávamos?


4. Quem faz suas roupas?


5. Do quê suas roupas são feitas?


Poético

Obrigada por ler até aqui. Espero que tenha sido uma boa leitura para a hora das necessidades fisiológicas ou quem sabe, para passar o tempo enquanto espera sua consulta..

Abaixo, listarei as fontes e o site Fashion Transparency Index - site que classifica a transparência de dados das grandes marcas, inclusive, possui uma área para marcas que atuam no Brasil como C&A, Youcom, Renner, Osklen etc.


Durante a pesquisa para esse texto, nenhum adolescente foi ferido, entretanto, fui fraca e comprei essa bota na C&A (confira o resultado dela e de outras marcas no Fashion T. Index!)


Até o próximo post,

sua anfitriã de textos que nos fazem ter depressão,


-Elle.


Fontes:








253 visualizações2 comentários

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2 Comments


mauricioozorio
Mar 26, 2022

bastante informativo o texto! So achei que ficou muito pessoal do gnomo aos bolos da pequena sereia, depois o texto volta ao rumo. Gostei da bota adquirida mesmo não sendo uma cor que me agrade. não entendi o funcionamento da peça desejada que nao foi comprada, era um body super cavado ou era a parte de baixo de um bikini? Outra coisa, sempre achei que o nome do site fosse: Ela Dentro. Aguardo os próximos textos.

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Elle Oliver
Elle Oliver
Mar 27, 2022
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Obrigada senhor Mauricio O! Primeiramente, não são gnomos, são seres mágicos de menor estatura. Realmente, todos os textos tem e terão uma parte ou toda ela de cunho pessoal. Convido a todos inclusive, dar sua opinião sobre os temas nos comentários. A peça em questão é um body bem cavado, uma cópia do original que aparece em verdades secretas. Como se fosse o contrário do maiô Borat. Sobre o nome ela dentro, declaro desde já, a forma oficial que irei mencionar a marca no futuro. Aguardo mais comentários nos textos futuros, abraços.

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